Entrevista com a realizadora Luz Feliz

Entrevista com a realizadora Luz Feliz

Neste mês de Março a Lux tem dado voz a mulheres em todas as suas nuances, desta vez, em entrevista exclusiva, trazemos a realizadora, actriz, e poeta Luz Feliz, para uma conversa em torno da sua estreia como realizadora com o curta-metragem Mulheres do Meu Bairro. 

Leia…

“Sinto que, com ele, represento inúmeras mulheres angolanas”

Luz FEliz

Quem é Luz Feliz?

LF: Luz Feliz é um ser humano que não se considera nada “qualquer” (risos), que nasceu aos 22 de Outubro de 1995. Formada em Saúde Pública pela Universidade Católica de Angola e estudante de Teatro na Universidade de Luanda.

É uma artivista que se assumiu recentemente como artista multidisciplinar. Uma mulher apaixonada pelas artes em geral e faz trajectórias por performances contemporâneas, desde o teatro, Spoken word e, brevemente, em primeira mão para a Lux, no stand Up comedy também, se não desistir antes da estreia (Risos).

Quando se descobriu realizadora?

LF: sempre me imaginei a contar histórias através de imagens, faço isso por meio dos poemas, mas sempre quis, bem lá, no fundo, fazer através da arte visual, por isso sempre me interessei pelas artes visuais. Imaginar-me a fazer um filme era um pouco improvável, pois tenho tido dificuldades em fazer vídeos profissionais dos meus poemas. Os meios para tal são tão caros que nunca me atrevi por meios próprios. Aí surgiu o concurso da Mosaiko…

Quais as dificuldades que tem encontrado?

LF: como disse anteriormente, são os meios que não possuo, materiais e económicos para sustentar um projecto de qualidade em que se respeitasse também a dignidade de quem se doasse a trabalhar comigo nele.

Em Angola, o cinema é maioritariamente um mundo de homens, como é ser uma realizadora em Angola?

LF: em Angola quase tudo é um mundo de homens (risos). Assim como em quase tudo, a luta para não cedermos ao empurra-empurra para o espaço doméstico é constante, interna e externamente. Uma realizadora é praticamente quem dá todas as ordens, e por si só dar ordens “não fica bem para as mulheres”, então saber lidar com o nosso, mas, principalmente, o ego de quem trabalha connosco, é crucial. Vou vos confessar, é muito prazeroso!!!. Uma satisfação enorme ver todo o sacrifício valer a pena é o trabalho a ser reconhecido.

Como tem sido possível produzir as suas obras?

LF: além deste filme, apenas produzi uma curta do meu poema “Caos Capital”. De tal modo que considero “Mulheres do Meu Bairro” a minha primeira produção cinematográfica consciente. Mas sim, nestas duas tem sido na base da aventura e de parcerias.

Tem tido algum tipo de apoio financeiro ou de outro género?

LF: as parcerias são com amigos que têm os meios e se disponibilizam para a materialização das minhas ideias. Com o “Mulheres do Meu Bairro” pude, após vencer o prémio, remunerar quem aceitou antes embarcar na aventura. Gostaria muito de ter apoios e continuarei a lutar para tal.

Na sua opinião o que pode ser feito para melhorar o panorama da produção de vídeo arte?

LF: acredito que seria óptimo que mais concursos do género existissem, que se impulsionassem jovens que, como eu, têm ideias e disponibilidade para a realização, mas não têm os meios.

Mulheres Do Meu Bairro

Como surgiu a ideia para este filme? Que conceitos explora?

LF: por ser feminista e já trabalhar com a arte como forma de activismo de género, para mim, foi simples, mas uma inspiração bonita. O filme é 90% mudo porque tivemos pouco tempo, e como actriz, sei que falar naturalmente é um dos trabalhos que exige mais dedicação na representação e como a produção foi totalmente minimalista  foi o melhor a se fazer.

Qual o contributo que traz o filme para uma reflexão sobre a mulher na periférica?

LF: no filme retrato as violências que as mulheres periféricas sofrem do Estado, por conta das políticas públicas segregacionista para as mulheres. Transcende a questão de violência doméstica, proponho um olhar diferente e talvez, menos estereotipado. Como filme, podemos todos olhar de uma perspectiva diferente, os inúmeros problemas que a mulher periférica pode enfrentar durante a vida.

Sente-se representada no filme?

LF: sinto que, com ele, represento inúmeras mulheres angolanas.

Como gostava que as mulheres recebem o seu filme?

LF: como um abraço e como uma proposta, não apenas para conversarmos, mas um chamado para a hora da mudança. O que sempre foi,  não tem de continuar a ser.